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Pertinente e oportuna, a análise realizada pelo diplomata Eugênio Vargas Garcia em O Brasil e a Liga das Nações (1919-1926): vencer ou não perder, é parte da importante coleção Relações Internacionais e Integração editada pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul em parceria com a Fundação Alexandre de Gusmão. Lançada em um momento em que ainda discute-se, embora de forma menos incisiva que em meados da década de noventa a aspiração brasileira de tornar-se membro permanente do Conselho de Segurança das Nações Unidas, a obra vai além da síntese histórica e oferece meritória
tentativa de explicação e interpretação da participação brasileira na primeira organização internacional de cunho universal que propunha uma gestão coletiva da paz.

Nascida como resultado das negociações que se seguiram ao fim da Primeira Guerra Mundial, em 1919, a Liga (ou Sociedade) das Nações visava dar estabilidade ao ordenamento jurídico internacional, criando uma idéia de autoridade supranacional nas relações internacionais, ao mesmo tempo que buscava gerar mecanismos capazes de evitar uma nova grande guerra. Criada oficialmente pelo Tratado de Versalhes e com sede em Genebra, contava com três órgãos principais: o Conselho, a Assembléia e o Secretariado. Muitos a consideraram um nascituro morto, pois apesar do então presidente americano Woodrow Wilson haver sido seu principal idealizador, os Estados Unidos se manteria fora da Liga, abalando assim seu princípio de universalidade.

Garcia desvenda três momentos ou temas principais da participação do Brasil na Liga que, em suas palavras, evolui da adesão total à crítica implacável.: a condição de membro fundador e sua atuação nos primeiros anos da Organização; a cega meta do assento permanente no Conselho perseguida pelo governo Artur Bernardes; e finalmente, a retirada do Brasil da Liga.

A posição do Estado brasileiro ao fim da Primeira Guerra Mundial, na qualidade de país beligerante ao lado dos aliados, propiciou sua participação nas negociações de paz, e conseqüentemente nas conferências que estabeleceram a Liga das Nações. Nesta oportunidade, agiu o Brasil de maneira dúbia, ao defender primeiramente o princípio idealista de igualdade entre os Estados, mas posteriormente negando-o diante da possibilidade de sentar-se entre os grandes no Conselho da organização, ainda que de forma não permanente.

Do contentamento e da devota dedicação aos assuntos da Liga durante o governo Epitácio Pessoa, a posição brasileira sob o comando de Artur Bernardes a partir de 1922 passou a ser muito mais incisiva com relação ao Conselho. Criou-se a Delegação Permanente do Brasil junto à Liga das Nações, foi apresentada uma proposta de suplência dos Estados Unidos, tentou-se a fórmula Brasil-Espanha como membros permanentes, e a atividade intensa da delegação brasileira visava aumento de prestígio e reconhecimento por parte dos outros países. A campanha pelo assento permanente era o principal objetivo diplomático do governo Bernardes, não poupando assim esforços da chancelaria.

Vencer ou não perder. foi a tônica de atuação da delegação brasileira, sob instrução do presidente, no decorrer da crise de março de 1926. O sucesso dos acordos de Locarno previam o estabelecimento de um regime de segurança europeu, além da adesão alemã na Liga, o que complicou a corrida. em busca do assento permanente. A discussão a respeito da reforma do Conselho ampliou-se com o surgimento de novos atores, e o Brasil optou pelo veto à entrada da Alemanha, culminando com a retirada brasileira da
Liga.

Se no decorrer dos capítulos pode o leitor ansiar uma análise mais detida de alguns fatos e seus desdobramentos, é na conclusão que o autor sintetiza, de forma muito clara, sua interpretação acerca das motivações, dos interesses e objetivos da participação do Brasil na Liga. Organiza de maneira bastante eficiente a riqueza de dados de que dispõe, fruto de sua pesquisa nos arquivos do Itamaraty, de Afrânio de Melo Franco, Lindolfo Collor, Ruy Barbosa e Epitácio Pessoa, além de inúmeros jornais nacionais e estrangeiros da época. Destarte, não escapa de sua análise o papel da personalidade dos atores no poder, a dinâmica interna do processo decisório e a influência da opinião pública.

Ainda que o cenário internacional e doméstico sejam completamente distintos dos anos vinte, e que os interesses do Brasil na ONU sejam muito maiores do que os que possuíamos na Liga das Nações, é útil que a nossa diplomacia conheça a experiência brasileira na Liga. Com isso, a obra de Eugênio Vargas Garcia faz-se sobremodo atual e oportuna, no momento em que o governo brasileiro apresentou o projeto de candidatura a um assento permanente no Conselho de Segurança da ONU na eventualidade da organização vir a ser reformada. O livro representa, ademais, notável contribuição acadêmica no campo das Relações Internacionais, preenchendo importante lacuna na moderna historiografia das relações internacionais e da política exterior do Brasil.

O Brasil e a Liga das Nações*

Susan César**

* GARCIA, Eugênio Vargas. O Brasil e a Liga das Nações (1919-1926). Porto
Alegre/Brasília: Editora da Universidade/Fundação Alexandre de Gusmão, 2000, 167 p.

** Mestranda em Relações Internacionais da Universidade de Brasília (UnB).

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